sexta-feira, 20 de agosto de 2010

O Homem e a sua sexualidade a partir das Ciências Humanas - Parte II


por Tiago Eurico de Lacerda

2. O conceito de homem a partir das ciências humanas

Como já explicitado na introdução o homem foi tomado pelas ciências humanas como objeto. Cada ciência estuda o homem a partir de sua especificidade. O que muda com as ciências humanas é a imagem global do homem.

A ideia de ciência humana implica, com efeito, que o homem não é sujeito, nem sujeito cognoscitivo (ele não sabe o que é, e cabe então a ciência dizê-lo) nem sujeito de ação, (pouco importa que ele pensa, ele não domina suas próprias ações e a ciência mostra isso). [1]

Se o homem não sabe o que é e não pode dizê-lo como entendê-lo nesta dinâmica social que continua atribuindo à ciência o poder de dizer as coisas de forma irrefutável? Como poderemos dizer então que é o homem, se ele mesmo não sabe o que é? O que a ciência concluiu com suas implicações a cerca desta problemática? As ciências já disseram sobre as relações sociais deste homem, e esta área ficou a cargo da sociologia, a cultura deu conta de dizer sobre a etnologia, a história sobre os rumos do homem e assim se segue. E além do homem não ter acesso a si mesmo, o que está ao seu alcance não pode ser tido como certeza, levando o homem ao engano.

As ciências humanas não são uma análise do que o homem é por natureza; são antes uma análise que se estende entre o que o homem é em sua positividade (ser que vive, trabalha, fala) e o que permite a esse mesmo saber (ou buscar saber) o que é a vida, em que consistem a essência do trabalho e suas leis, e de que modo ele pode falar. [2]

Percebemos aqui que este homem do qual trata as ciências humanas é um homem histórico, tudo nele é herdado. Ele vive porque participa da vida que também é legada aos outros seres; ele trabalha, pois precisa de se inserir na sociedade pelo labor onde extrairá o seu sustento e o de sua família; e ele é dotado de fala que delimita seu mundo e comunicação. Mas podemos também levantar a questão de que o homem não é, ele próprio, histórico pelo fato de ter de constituir sua história submetido às transformações nas condições de vida, nas formas e nos usos da língua. Ele é protagonista nessas histórias, já que é ele quem vive, quem fala, quem produz e consome. Assim, pela primeira vez, pensou-se o homem como um ser exposto aos acontecimentos.

[...] uma vez que o homem histórico é o homem que vive, trabalha e fala, todo conteúdo da História [...] concerne à psicologia, à sociologia ou às ciências da linguagem. Mas, inversamente, uma vez que o ser humano se tornou, de ponta a ponta, histórico, nenhum dos conteúdos analisados pelas ciências humanas pode ficar estável em si mesmo nem escapar ao movimento da História. [3]

Assim podemos dizer que as ciências humanas nos mostram que sempre haverá maneira de pensar o que já foi pensado de uma forma diferente. Mas concluímos com o seguinte pensamento de que o homem das ciências humanas é este ser que não pode dar conta do que ele é, nem dominar o que faz cuja natureza própria consiste em opor-se a natureza fora dele. Mas as ciências humanas não admitem um dualismo cartesiano, são antinaturalistas. Rejeitam que somos seres naturais porque nós nos inventamos e nos reinventamos a todo o momento. Assim desloca-se o eixo da consciência de ser um ser que pensa, para ser um ser do discurso.

[1] NOVAES, Adauto. A condição humana. p.47.

[2] FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. p.488.
[3] FOUCAULT, M. As palavras e as coisas: uma arqueologia das ciências humanas. p.513.

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